BATIDAS SELVAGENS! ( SUSTO REPENTINO).

Frio intenso nesse fim de tarde chuvosa. Inverno rigoroso. Encapotada até os pés, ainda assim o queixo treme. Vou até a sala de estar e acendo a lareira. Percebo que as lenhas estão acabando. Só dá para mais uma vez. Penso em ligar e pedir mais um bom tanto delas. Prevenir é sempre bom! Que gostoso; já estou sentindo o calorzinho invadindo o ambiente. Devagar vai ficando bem aquecido. Até esqueço do frio. Sensação deliciosa invade o meu corpo. “Sensação de útero materno”! Vou até a cozinha buscar um chá de erva cidreira. Meu favorito! Pego a xícara de porcelana vermelha que foi de minha avó. Tenho um carinho especial por ela. O chá fica mais gostoso. Adoro essa xícara! Volto à sala novamente. Retiro de cima da mesinha redonda de canto um livro e alguns artigos que estou começando a ler sobre “Auto conhecimento.” Presentão de meu amigo João. Ele adora psicologia! Folheio um pouco. Leio alguns trechos interessantes. (Costume antigo). A sinopse do livro resume a viagem fascinante ao nosso mundo interno. Continente muito pouco explorado pela maioria dos mortais! “A gente vive e morre sem se auto conhecer”! Um dos trechos descreve o conceito de Carl Gustav Jung, falando sobre o processo de individuação. Tornar-se um Ser integral. “Autônomo e independente”. Buscar o equilíbrio entre corpo, mente, alma, emoções e relações. (Precisamos manter essas áreas em equilíbrio para estarmos bem na vida). Começo a ler o primeiro capítulo. O tema vai se aprofundando um pouco mais, falando sobre dores do passado, relação com a mãe, o pai e a criança interior. Encarar as feridas para curar-se! Descobrir a máscara que foi construída para  proteger essas feridas que acabam encobrindo o ser. Aprofunda também sobre conteúdos psíquicos não expressos! “Soltar as feras”! Vou saboreando intensamente essa leitura. Pego um almofadão pra ajeitar melhor a coluna. Tomo um gole do chá, que nessa altura já esfriou. Infelizmente. Adoro bem quente! Leio outro trecho que aborda a importância do conhecimento de si mesmo. “Apropriar-se de suas qualidades, limitações, desejos, ambições. Facilita o autocontrole. Desenvolve objetivos de uma forma mais integrada”. O texto relaciona também a importância da prática da meditação como caminho da auto  realização. Essa prática ajuda  no processo de identificar o que precisa ser mudado e, a partir de nossa transformação, obter uma vida mais funcional e plena. Enfatiza que a ausência do auto conhecimento dificulta o nosso eixo, alterando o sistema energético, podendo fazer com que dependamos excessivamente da opinião do outro. Desenvolver auto cobrança exagerada e muita  crueldade consigo mesmo pode ser outra das sequelas. “Fragiliza a pessoa”. Fui me envolvendo com a leitura e não percebi o tempo passar. Nem o sono chegar. Cochilei mesmo. Também nessa sala quentinha! Acordei do cochilo com os olhos ainda sonolentos. Parecia que tinham areia. Percebi o livro entreaberto, caído no tapete. Branquinha, “parece uma bola de neve”, amada filhinha peluda, com uma das patas em cima do meu braço querendo me acordar. Sufocando-me com seus beijos. Que felicidade ter a minha Branquinha! Retribuo intensamente os carinhos. Afago muito seus pelos macios enquanto a encho de beijocas. Vou até a cozinha buscar chá quente. Enquanto isso, o telefone toca insistentemente. Olho para o telefone. Resolvi não atender. Era o Júlio César. Sempre inadequado. Caramba. Ele consegue! Estou me sentindo tão bem aqui. Julinho (assim que o chamo), detesta livros! É um cara legal, mas, pessimamente formado. O que me atraiu nele é a espontaneidade e o seu jeito natural de ser. Não tem o menor interesse em entender como funciona o psiquismo. Tento trabalhar nossas diferenças o tempo todo! Não sei se vai dar! Tenho um interesse enorme em conhecer minhas profundezas e buscar equilíbrio entre a mente e o o corpo. (Júlio Cesar é meio ignorante, só gosta de ouvir notícias na televisão. Nada intelectual)! Para mim, leitura é vitamina! Enquanto divago sobre isso, percebo, fixados em mim, dois olhinhos brilhantes e curiosos. Não aguento! Rolo no tapete com a bolinha de neve até a gente se cansar. Esgotada, ela adormece em cima da almofada como um anjo. Sento-me na posição de eixo. Respiro fundo. Tento contatar  sentimentos presentes. Conecto. Relaxo! Começo a meditar e identificar sensações. Entregue, numa sintonia absoluta com o meu eu; nesse momento sou interrompida com fortes batidas na porta (campainha quebrada).  Branquinha acordou assustadíssima. Latiu muito. Peguei minha linda no colo. Senti seu coração disparado. Apertei-a contra o meu peito, com muito carinho. Fui pra bem perto da porta, reconhecendo aquela batida, pergunto meio brincando : QUEM SERIA O SELVAGEM? MUITOS RISOS VINDOS DE FORA!