BOCA DE BALEIA. ( RELACIONAMENTO ABUSIVO).

Maria Carolina, catarinense, alta e esguia. Porte orgulhoso e nobre que tenta manter diante das adversidades da vida. Criada a beira mar, adorava andar descalça nas areias macias das praias que frequentava. Uma ligação muito íntima com as águas. Sempre nadou como sereia. Nos dias de boas ondas pegava sua prancha e sumia no mar. Com a separação de seus pais, aprendeu a se defender sozinha das angústias que acometiam o seu coração. Foi difícil enfrentar essa nova realidade. Muita coisa mudou em seus dezessete anos de vida. As águas já não eram tão azuis! Amava seu pai. Modelo de homem. Imperfeito, perfeito! Identificava-se com ele.  Modelo desfeito como vapor dissipando-se no ar. Insegura e triste buscou desesperadamente novas referências. Nesse estado de extrema fragilidade, conheceu André Luiz. Personalidade semelhante à do pai ausente. Visual bonito. Determinado e inteligente. Sedutor. “Soube seduzir a sereia”! Num repente, para ela parecia que a vida estava colorida novamente. Transferiu para “Dezinho”, esse era seu apelido, toda sua carência e instabilidade emocional. Ele, com vinte e oito anos de idade, agia como um homem maduro e experiente. Aspectos que encantou ainda mais Maria Carolina.  Em seu interno houve uma substituição da figura paterna. (Começo do grande problema)! Sem se dar conta, entrou nessa relação com o papel de filha. (Teria que obedecer às regras de Dezinho). A mulher cheia de desejos e sonhos ficou escondida, bloqueada em seu interior. Sem identidade adulta. Relação iniciada fora dos padrões saudáveis entre um homem e uma mulher! Depois do encantamento a filha foi descobrindo o pai sem escrúpulo e sem respeito com quem tinha construído sonhos. Chocou-se. Já conhecia esse filme! A revelação deu-se pouco tempo depois de estarem vivendo sob um mesmo teto. Com traços psicopatas, André Luiz sabia muito bem fazer igual a um morcego (chupa o sangue e lambe). Subjugava Maria Carolina nos pequenos detalhes da vida rotineira de um casal. Desrespeitava sua companheira, na intimidade e publicamente. Apelidos pejorativos à sua imagem de mulher. Críticas ácidas e destrutivas constantemente. Sentia-se o dono dela. Detestava que ela reagisse com brigas ou lágrimas. Dizia, com voz ríspida ou sarcástica, que ela era chata e mal humorada. Uma criança chorona! Precisava virar mulher e saber ser feliz com ele. Depois, simplesmente, fechava o tempo! (Atitude recorrente). Esses episódios significavam apenas uma pitadinha dos momentos abusivos que aconteceram ao longo de seu relacionamento. Almoço em casa muitas vezes foram sinônimos de brigas e humilhações. André Luiz despejava gratuitamente suas neuroses  e traços patológicos de seu caráter sobre sua bela e insegura Maria Carolina. Esse sofrimento sufocado, aos poucos, a foi definhando. Emagreceu. Deprimiu. Foi perdendo vitalidade e alegria de viver. Nessa auto sabotagem, inconsciente, Ana Carolina não percebia a areia movediça em que estava atolada. Sentia-se muitas vezes a vilã da história. (Será que sou eu a errada?). As palavras de André Luiz, muitas  vezes, a convencia de ser a culpada pelo inferno emocional entre eles. “Duvidava dela mesma”! Assim foi transcorrendo o tempo e Maria Carolina resignando-se com o clima de desrespeito e humilhação. Adaptou-se naquela relação, destrutiva e invasiva, de uma forma patológica. O fato de não conseguir engravidar foi outro aspecto que a enchia de culpa e aumentava sua baixa auto estima. Passou a sentir-se incompetente sexualmente, como mulher. Noites e noites mal dormidas.  Não conseguia se desvencilhar desta prisão de dependência emocional e de auto- sabotagem. Passados seis anos nesse quadro doentio, surgiu uma viagem profissional de André Luiz ao exterior. “Momento transformador!” Maria Carolina resolveu ir em segredo visitar a avó materna que morava no sul. Desde que veio residir em São Paulo, não tinha mais voltado à Santa Catarina. Morria de saudades, mas não se permitia. Desta vez, resoluta, enfrentaria o seu medo. Encheu-se de coragem e foi matar  suas saudades. Respirar ares novos. Nem questionou de onde veio essa força. (Foi assim como um passarinho acostumado com a gaiola mas que não esquece como era voar).  Aproveitaria e mataria todas as saudades acumuladas e doloridas. “Mãe e avó moravam juntas há seis anos, desde o seu casamento”. Tinha noção de ter  evitado esse encontro por conflitos entre elas e André Luiz. Definitivamente ele não gostava delas. Nem elas dele. Evitavam piorar o casamento fragilizado de Ana. Comunicavam-se através de telefonemas oportunos, embora a  amassem muito.  André Luiz as considerava ignorantes e desniveladas. Maria Carolina se afastou da família tentando preservar o relacionamento já tão desgastado. Abriu mão de suas origens e afetos genuínos. Sentia-se ameaçada! (Síndrome do sequestrador e sequestrado)! Agora, com a chance da viagem prolongada de “Dezinho”, sentiu-se invadida por uma nova energia.  Resolveu ir passar um fim de semana. Talvez dar uma esticada maior.  Aproveitaria também pra matar saudades dos amigos de infância. Tão esquecidos! Especialmente Renatinho, com quem, nos bons tempos, viajava nas ondas do mar azul. Soube que ele estava solteiro ainda. No dia da viagem, acordou ansiosa. Feliz da vida. Tomou um banho e café rápido. Chamou um taxi. Chegou cedo ao aeroporto. Coração disparado. Há quanto tempo não se sentia tão leve! Durante o voo, sentiu-se literalmente nas nuvens. Assim que chegou em Florianópolis sensação  maravilhosa. Frio na barriga. Custou a acreditar. Prepararam uma festa surpresa. Não esperava por tanta alegria. Radiante. Reviveu emoções profundas registradas na alma. Tanta gente querida! Encantou-se. Especialmente com  Renatinho. Velho companheiro de tantas brincadeiras. Tornou-se um  rapaz forte. Porte atlético. Surfista profissional. O abraço entre eles selou um recomeço de algo que nunca deveria ter sido interrompido. Conversaram horas a fio. Mãos entrelaçadas. Nem disfarçavam a explosão de sentimentos emergidos. A paixão nasceu ali! O paraíso chegou. Maria Carolina não mais voltou à capital. Abandonou seu cárcere e o sequestrador. Quer surfar corajosamente nas ondas do amor próprio e auto respeito. Já entendeu que o tom das águas depende somente dela. Não admite mais ser engolida pela baleia assassina. Já sabe se proteger!

LAURO ! ( SOM NO SILÊNCIO).

Lauro, meu papagaio, está presente há uns bons anos em minha vida. Companheirão amado e fiel. Noutro dia, estava na sala, tranquila, focada, assistindo a uma reportagem especial que falava sobre a importância da educação na formação do caráter nas pessoas. Compenetrada, ouvia o  especialista explicar que o caráter é construído através de hábitos, orientações e contatos que fazem parte da experiência individual. Ressaltava que as atitudes revelam a pessoa, traduz como ela funciona. Falava, também, como a primeira infância  é uma fase fundamental na formação do caráter, ressaltando também a adolescência onde se revive o Édipo. Eu já tinha lido algo a respeito, mas, os detalhes estavam atualizando a minha curiosidade. O especialista falava de uma forma motivadora e fácil sobre o significado emocional das construções internas. Fui acompanhando esses temas importantes. Trouxe temas da psicologia sobre o desenvolvimento do psiquismo humano, como funcionam os bloqueios emocionais e a forma como se refletem na formação do caráter. Doutor Pedro, ressaltou ainda, a  importância do contato afetivo e do contato do amor dos pais em relação a criança.  Como esses aspectos podem auxiliar  na construção de uma pessoa saudável e equilibrada. (Priorizar a qualidade do contato). Durante  pausa de quinze minutos, aproveitei e fui até a cozinha tomar um chá verde, bem quentinho. Caiu tão bem! Saboreando, sentei-me na cadeira de madeira entalhada, pertinho da janela. Inspirei o perfume dos jasmins vindo do quintal. Delícia! Inspirei fundo. Sentindo ainda mais o delicioso aroma.  Começo a refletir  sobre todos os assuntos pautados naquela reportagem. Não sei porque, lembrei, de repente,  da história de Maria Eduarda, ex-aluna, muito querida, com sérios problemas emocionais. Lembrei- me de seus olhinhos tristes, pedintes de  amor. “Cruel, criança sofrer”! Queria muito vê-la feliz como seus colegas de classe. Doía muito perceber  angústia em seu olhar infantil. Meu instinto protetor ficou aguçado. Busquei contato com ela. Fui me aproximando de  sutilmente de Maria Eduarda. Queria conquistar sua confiança. Busquei me aproximar de sua família. Fiz tudo que pude! Eduarda fazia parte da primeira turminha com qual  eu tinha o compromisso de  instruí-las e mostrar o quanto possível, como a vida pode ser bela! Tornar-me professora foi um sonho desde criança. Logo que me formei em pedagogia, consegui essa primeira classe. Lá havia lindos pares de olhos curiosos, me esperando.  Alunos entre cinco e seis anos de idade. Apaixonada, nem sentia o tempo passar. Adorava lidar com aquelas energias cristalinas. Quinze energias. Meninos e meninas. Na calma daquela noite, ali sentada, tomando meu chá, as informações transmitidas na reportagem, trouxeram a presença de Eduarda muito viva em minha mente. Relacionei instintivamente, o que tinha entendido sobre os conceitos de psicologia com a história de carência afetiva da minha menina. Encaixava perfeitamente no caso dela. Menina triste e delicada, sensível e muito carente. Dona de uma criatividade incrível. Sabia construir através de seus desenhos, historias fortes e simbólicas, com personagens singulares. Fechada em si mesma! Não interagia com coleguinhas. Nas tarefas em grupo não participava. Preferia estar só em seu mundo imaginário. Nasceu um carinho muito grande entre nós. “Minha criança interna identificou-se com Eduarda”. Eu era a única companhia com quem ela se expressava. Demonstrava sentir-se acolhida e segura. Seus olhinhos quase negros, mostravam um brilho incomum sempre que estávamos próximas. Certo dia, um fato transformador mudou rumos! Envolvida com a criançada, bem na hora do lanche, enquanto todas corriam e brincavam, notei Eduarda sozinha num cantinho do pátio. Cabisbaixa! Fui até ela apressadamente. Segurei suas mãozinhas, frias e úmidas. Muito pálida. Esse quadro me preocupou.  Segurei-a  no colo, apreensiva. Imediatamente chamei nosso medico de plantão. Depois da avaliação criteriosa, foi constatado que era um quadro apenas de fundo emocional. Muita ansiedade naquela criança! De certa forma, fiquei mais tranquila. Resolvi chamar seus pais para uma reunião. Insisti que fossem eles próprios e não a babá como sua mãe propôs. ( Para ela babá representava a mãe em tudo).  Busquei conhecer toda a história na intimidade de seu lar. Constatei que seu ambiente familiar era excessivamente frio. Sem contato. “Pais ausentes”. Quem cuidava dela eram babás temporárias que viviam se revezando. Soube que a mãe de Eduarda não hesitava em despedir funcionárias por motivo banais. Nenhuma delas podia fazer qualquer comentário sobre  carência e necessidades de Eduarda. “Doutora Fernanda”, mãe, de Eduarda, dava tudo a filha, menos amor. Em sua visão, babá tinha que suprir qualquer necessidade da criança. ” Para isso era bem remunerada”. Rígida e prática, detestava mi mi mi!  Vivia enfronhada em sua promissora profissão de cirurgiã plástica, congressos e muito trabalho hospitalar. Encontros a noite com amigos, ocupava o resto do tempo. Seu marido também cirurgião, acompanhava a mulher em tudo. Viviam como namorados! Normalmente quando chegavam em casa tarde da noite, Eduarda já dormia. A coordenação da escola, convocou uma reunião com os pais de Eduarda. Foi produtiva! Conseguiu derreter um pouco do gelo da “doutora Fernanda”.  Mencionei situações e fatos ocorridos na escola que ela ignorava. Demonstrou surpresa. Certa indignação! Na cabeça dela aquilo era inusitado. Não podia ter acontecido! Não se considerava uma mãe negligente. Depois de longas conversas, nossa psicóloga sugeriu psicoterapia. Fernanda, surpreendentemente, resolveu tentar. Iniciou terapia familiar e individual. Foi o momento transformador na vida de Eduarda. O tempo passou. O ano escolar terminou.  Sutis mudanças no comportamento de Eduarda. No ano seguinte,  chegou com sorriso mais aberto, interagindo mais  com as outras crianças. Maior viço no olhar. “As coisas foram se reestruturando”. Fernanda está se descobrindo como mãe. (O Caminho do auto conhecimento pode ser a cura dos males do coração)! Hoje, sempre que Eduarda me encontra no pátio, nos intervalos,  ganho um abraço quente. Apertado, apertado. E seu beijo?  Envolvida nessas sensações, distraída, tomando o último gole de meu chá, ouço  voz estridente:- “LOLITA, LOLITA. LOURO QUER CAFÉ”!

AMOR E PAIXÃO (CONFLITO).

Domingo. Saboreando uma taça de vinho tinto, na ampla  varanda de meu apartamento, frente ao mar. Raro momento, mesclado de prazer e saudade. Certa nostalgia no ambiente. Raios faiscando no horizonte e um mar violento como pano de fundo. Ondas gigantes. Assustadoras. Aqui, eu e meus pensamentos. Torturantes. Infiéis e traiçoeiros. Malditos pensamentos! Chegam sem serem convidados, abalando a aparente harmonia que insisto transparecer real. Coisas do meu racional. Tremendo rochedo que não deixa vazar quase nada do que sinto. Quase! Batida de maracujá consegue enfraquecer esse rochedo! Sozinho, sentado na poltrona verde musgo comprada há anos, poucas semanas antes do casamento. Em meio a correria do casório resolvi ir até Itatiba, cidadezinha próxima, onde havia ofertas de excelentes móveis. Assim que avistei aquela poltrona no canto da loja, logo de cara, me apaixonei. Verde foi sempre minha cor favorita. Tinha um design perfeito. Feliz, arrumei meu ninho, como um “bem te vi” apaixonado pelo canto em que iria morar, enfeitiçado por aquela pessoa que tinha encantado a minha vida tão profundamente. Quantas loucuras! Devaneios malucos. “Travessuras de crianças”. Quantas! Tudo tão perfeito. Dava medo de tanta felicidade; porém, o senhor tempo, poderoso e transformador, trouxe alterações. Com certeza, lições importantes, também. Temo que eu não tenha sido bom aluno. Os anos foram se passando. Do fogo, restou fumaça. Densa. Escura. Algumas vezes colorida. Não percebi que mudanças lentas, quase imperceptíveis, foram deixando buracos internos e um vazio angustiante no coração. Instinto de vida reagiu, fortemente, fundamental aos sentidos, na busca da sobrevivência. Faltava pulsação dentro de mim! Precisava sentir motivação pela vida. Foi então que inconscientemente acolhi uma nova pessoa em meu coração. Chegou, sem pedir licença. Ancorou-se. Foi construindo um mundo colorido que  nem lembrava mais existir. Nutriu tanto! Fortaleceu sentimentos anêmicos, quase falidos. Nova vontade de viver. Fui ancorando num quadro emocional ambivalente, cheio de altos e baixos. Muitas vezes o diafragma aperta exageradamente. Inspiro fundo e vou levando a vida sentada na mesma poltrona verde, onde bem-te-vis nem fazem mais questão de alimentar os antigos sonhos. Ao mesmo tempo, novas âncoras emocionais estimulando meus sentidos, trazendo vida e colorido. Culpa? Sempre! O mar sabe bem de minhas histórias. Sempre ouve meus queixumes apaixonados. Indecisos. Neste início de tarde, raios no céu turquesa, assustando pela beleza e força, tocaram meu fogo interno. Tão forte! Conseguiram desestabilizar a rígida estrutura psíquica que montei pra me enganar. Neste estado vulnerável, num repente, ouço uma voz companheira e amorosa, chamando:- AMOR, O ALMOÇO ESTÁ NA MESA!

CASAMENTO RECORRENTE! (TENTATIVA).

Equilíbrio mental? Impossível, naquele contexto. Idealizei uma relação com um cara que nunca existiu. Só tinha vida em minhas fantasias. Aliás, fantasias muito caras. Preço alto a pagar! Bagunçaram toda a minha estrutura psicológica. Perdi a identidade. Esqueci de mim. Durante anos aquele homem vulcão soltou lavas queimando e devastando o meu bom senso e amor próprio. Fui me transformando numa pessoa fria e esquisita. Perdendo a sensibilidade e alegria de viver. Enrijeci! Desenvolvi couraças protetoras, alterando a minha primeira natureza. Sergio Ricardo conseguiu! Identifiquei-me com a sua casca de crocodilo. Ficamos iguais! Comecei a viver a vida de forma prática, assim como ele. Fui seguindo sem olhar para trás. Pedi o divórcio! Sai do relacionamento tóxico. Precisava ser feliz. Iniciei um novo caminho levando as sequelas da toxicidade vivida com aquele homem. Dores de estomago. Zumbido na cabeça. Ansiedade! Fragilizada e assustada, busquei tratamentos naturais. Chás caseiros aos montes. Alongamentos, respiração e meditação. Iniciei alimentação vegetariana. Precisava reequilibrar o psicológico e o meu organismo. Estresses vividos foram intensos e danosos. Depois de uns tempos finalmente voltei para mim. Fazendo muitas reparações. No meu ritmo, fui resgatando valores perdidos. (Sensação incrível sentir-se conectada consigo mesma). Voltei a frequentar minha antiga turma da faculdade. Sair para dançar. Beber com amigos. Esqueci dores passadas. Percebi que a vida pode ser trágica e cômica. Senti isso na pele! O Halloween, trinta e um de outubro, foi realmente a noite das bruxarias em minha vida. Distraída, dançando, vestida de “Dama da noite”, percebi um zorro alto e esguio do outro lado do salão. Olhos fixos em mim. Desviei várias vezes do insistente olhar. Na medida em que disfarçadamente foi se aproximando, notei um verde muito intenso naqueles olhos risonhos. Mistura de energia e sedução foram se intensificando. Num milésimo de segundo, senti minhas defesas se afrouxarem. Desde que tinha terminado o relacionamento com Paulo Henrique, há dois anos e meio, aquela era a primeira vez que sentia atração novamente por alguém. Me estranhei. Resisti. Não sabotei a sensação maravilhosa que me envolvia. Estava carente daquela emoção. Sorrindo, dei boas vindas à vontade de viver. Abri meu melhor sorriso! Na medida que os olhos verdes foram se aproximando senti certa familiaridade com a expressão e a figura daquele zorro. A fantasia que ele usava camuflava traços físicos. Mas o olhar… Frio na barriga antigo se intensificou! Encoberto por sua capa preta e máscara aproximou-se, descaradamente, envolveu-me pela cintura. Saímos dançando feito loucos. Quando me dei conta estávamos girando muito no centro do salão. Tudo tão rápido. Tão mágico. Eu era a rainha da festa naquele momento! A mais linda e desejada. Assim que me sentia! Depois de muitos giros e danças, a música foi se acalmando, lentamente, até que pausou. Sei lá, “PAULO HENRIQUE SOUBE FAZER DO INTERVALO UMA NOVA SEQUENCIA”! RECAÍDA?

IMERSÃO NA FANTASIA! (METAMORFOSE).

Sentada na areia. Olhar fixo. Ondas chegam barulhentas. Partem silenciosas. Chegam. Partem. Chegam. E partem… Incessantemente! Não pausam. Nem me ouvem. Não querem parir meus desejos. Ignoram meus pedidos. Meus anseios. Nem percebem o tamanho de minha angústia. Mar egoísta. Ondas maldosas. Sádicas! Imploro para que a energia desse azul se funda à minha energia. Elas ignoram. Malditas ondas! Soberanas. Desprezam minha dor. Coração aperta no peito. Cinza predomina em mim. Nelas, só o azul. Quase turquesa. Cor preferida do meu amor. Lúcio é turquesa! Sua energia com as pessoas tem esse tom. Comigo? Só quando faz amor. Noutros momentos, cinza escuro! Seu cinza é contaminante. Minha alma fica cinza também. Adoece. Só vitaliza quando entra no azul de Lúcio. Sexo azul  turquesa. Enlouquecedor! Pleno. Breve instante de onda azul. Turquesa, tom dos olhos que tiram meu fôlego. Momento simbiótico!  Coração dispara. Basta seu olhar, que esqueço de mim! Meus sentidos se envolvem num turquesa inebriante. Dançam nas ondas do mar azul. Quase se afogam. Surfam. Enlouquecem. Imploram carinhos. Malditos carinhos. Falsos! Eles não me querem de verdade. Hoje acordei cinza. Estou cinza. Fui contaminada pelo escuro cinza de Lúcio, assim como ondas do mar em dia de chuva. Seu olhar não me quer mais. Estou carente  do azul turquesa que remexe minhas entranhas e me faz sentir viva. Amanheceu um dia ruim! Cinza pincela,  cruelmente, minha alma angustiada. Tento aliviar sensações difusas olhando para o mar. Resolvo correr em direção a ele. Imerjo nas ondas azuis. Perigosas. Envolventes. Quero ser desejada. Possuída por elas. Ser azul. Azul turquesa. Afogar no profundo azul. QUEIMAR  NUM SOL TURQUEZA!

LOUCURA OCULTA! (VIOLÊNCIA DOMÉSTICA).

Caminhos me levaram a você. Que caminhos aqueles? Porque? Seria destino? Droga! Podia ter pulado aquele dia em minha vida. Se eu tivesse uma bola de cristal! Jonas entrou tão sorrateiramente em meu coração. Quase nem percebi. Quando me dei conta já estava totalmente envolvida e encantada. Maior erro que eu podia cometer! Esqueci de mim. Foi tão intenso. Ficou mania. Doença mesmo. Perdi a identidade. “Virei Jonas”. Fui sua ridícula sombra! Auto crueldade me submeter a tanta agressão psicológica daquele homem. Overdose! Custou reconhecer o “ser humano menor” que estava ali e ao  tamanho em que eu estava me reduzindo. Cega por paixão! Paixão por um doente! Aquele ser arrogante não sabia o que era respeito a uma mulher. Abruptamente se transformava num animal feroz e insensível, alternando com atitudes de extremo carinho em momentos diferentes. Desproporcional! Desequilibrado mesmo! Esse traço de caráter perverso emergia principalmente quando ele se  defrontava com minha alegria. Acho que mobilizava seus sentimentos bloqueados. Muitas vezes, causticamente, falava que eu parecia hiena. Sorria do nada. Sem motivo! No começo disso tudo eu nem ligava para o jeito doente dele. Até achava engraçado. Quando as agressões foram ficando recorrentes e mais intensas, algo dentro de mim sinalizou que não dava mais. Eu teria que tomar uma atitude! Essas cenas insanas sempre ocorriam quando estávamos a sós. “Loucura inteligente”. Encobria seu desequilíbrio dos olhares externos, no social. Disfarçava-se sob uma camada de bom humor e muitas brincadeiras. Era admirado pelo seu jeito educado, gentil e inteligente. Especialmente pela sua grana! “Socialmente, a imagem do bom menino que deu certo”. Dentro de casa, a besta explodia! Bastava contrariar seus caprichos ou vontades, lá vinha o “Jonas louco”. Desrespeito total. Lado escuro, mesclando mel e fel! Conturbava o meu mental. Ficava confusa. Enlouquecida, depois das crises. Não sabia o que fazer, duvidava até de mim! Muitas vezes imaginava que talvez Jonas estivesse apenas estressado, coisa de momento, quando arrependido,  cabisbaixo pedia desculpas. Ficava feliz. Quem sabe? Qual nada! Daí um tempinho ele se repetia em atitudes severamente neuróticas.  Nova decepção! Nova violência. Tentei ponderar e desculpar por quatro longos anos. Ele nunca quis fazer um tratamento psicológico. Dizia sentir-se  perfeitamente equilibrado. Perfeito! Muitas vezes, tive enorme vontade de sumir. Mandar tudo pro inferno! Virou uma gangorra a minha relação com Jonas. Baixos e altos. Altos e baixos! Muito mais baixos que altos. Minha energia sendo sugada de forma vampiresca. Com o passar do tempo fui mudando internamente. Cansando de perdoar. “O bom menino no social foi perdendo sua força dentro de casa”. Suas neuroses não engatavam mais em minhas neuroses. O nó lentamente se desfazendo. Ambivalência entre amor e raiva em que eu estava estagnada foi evoluindo num sentimento único, forte, anunciando sinais vitais de minha identidade. O meu emocional buscando  focar num caminho livre e claro. Amor e raiva se transformando em “Amor Próprio”. Lentamente e silenciosamente foi crescendo essa nova consciência, disposta a proteger minha integridade de mulher. Num belo sábado de sol aconteceu o ápice dessa relação emocional caótica que eu mantinha com Jonas. Animada, preparei uma reunião em casa, com amigos em comum. Tudo planejado. Tudo estava tranquilo.  Por um motivo banal, o imbecil do Jonas teve a audácia de  armar um novo e intenso barraco em cima de mim. Coitado. Bem naquele dia. Sem perceber minha transformação interna, a fera atacou novamente! Se deu mal. Desta vez me pegou mais fortalecida. Sem notar que eu estava diferente e  disposta a buscar alegria de viver, com ou sem  ele. Tremi de raiva! Muito desequilíbrio daquele doente. Por motivo banal ele recaiu! Estava segurando uma bandeja com copos cheios de cervejas, cantarolando com a música de fundo. Feliz. Distraída. Num repente, tropecei no pé de uma cadeira. Parece coisa do diabo. Jonas estava bem ali. Agachado. Amarrando o tênis. Sua bermuda ficou molhada pela bebida. Enfurecido levantou a cabeça abruptamente. Ficou em pé, soltando fogo pelo olhar. Transformou-se no demente que eu já conhecia. Rosto vermelho de raiva. Olhos saltando pelas orbitas. Até salivou de tanta fúria. Reagiu como se eu tivesse dado um soco no meio da cara dele, sem motivo algum. Reação absurda.  Insultou-me violentamente. Minhas pernas foram ficando trêmulas. Ele simplesmente, não ouvia minhas desculpas.  Esbravejava, me ofendendo, xingando de vadia, desastrada, infeliz! Gritava dizendo  que eu nunca fazia nada direito, mesmo.  Suas ofensas foram num crescer assustador, enquanto eu pedia mil desculpas. Soltou adjetivos pejorativos que derrubam qualquer dignidade.  Rir comigo do acontecido seria esperar muito daquele doente. Aproveitou que estávamos sozinhos na sala de jantar e despejou toda a raiva de uma vida. Confesso que fiquei com medo de sua loucura sem limites. Sorte que o pessoal da festa estava no quintal dançando e não percebeu o ocorrido. Seu olhar de ódio e violência no instante da fúria, deixou um registro do definitivo fim da nossa relação. Foi num estalo, em minha mente. Não queria, nunca mais, aquele olhar  de ódio sobre  mim.  Eu não merecia aquela violência! Calada e decidida voltei à festa. Estranhamente tranquila. Como se tudo estivesse maravilhoso. Dai a pouco surge Jonas, com uma gelada na mão. Dissimulado. Brincando e rindo.  Naquele instante, reafirmei em meu coração, que não queria mais Jonas em minha vida. A falta de respeito a minha pessoa estava sendo enterrada naquele momento! Com essa convicção, depois que todos foram embora e Jonas embriagado,  em sono profundo em nosso quarto, decidida, fui dormir no quarto de hóspedes. Sensação estranha e nova. Respiração ora leve, ora acelerada. Parecia que eu estava anestesiada. Dormi profundamente naquela noite. Acordei pela manhã, ainda esquisita. Sonhos de recomeço, de uma nova vida. Um tanto triste, por ter me auto sabotado durante tanto tempo e  permitir que aquele homem violento quase anulasse minha identidade. Jonas, por sua vez, ao acordar, fazendo-se de vítima, como sempre, tentou me seduzir e se desculpar. Tentou, beijos forçados. Frios. Frustrou-se! Afastei-o com firmeza. Senti  aversão!  Ele percebeu. Ficou sem chão ao ouvir minha decisão. Ali na cozinha, em pé, levantei a cabeça, olhei em seus olhos. Bem firme. Resoluta, sem titubear, pedi o divorcio. Surpreso. Agressivo. Gritou que eu estava louca. Precisava me tratar. Concordei!  Falei, então, que não se metesse com uma louca! Não seria mais seu tapete. Nem de homem, algum. Não deixei o desequilibrado Jonas, falar. Eu berrava! Meu coração saia pela boca. Vociferei todo o sufoco contido há anos. Ele ouviu tudo num silêncio assustador. Entendeu que era o fim. Silencioso, foi embora de casa naquela manhã de domingo ensolarada! Levou junto seu ego inflado e poucos pertences. Não deixei que levasse nossa gatinha, Lila. Saiu sozinho com o seu carrão vermelho! Foi embora de minha vida deixando rastros de mágoas. Muitas feridas para cuidar. Natural que eu chorasse algumas noites. Não sei se de raiva ou saudades dos falsos momentos bons. Não importa. Lavar feridas com lágrimas ajudam na assepsia da alma. Ando com dó de mim mesma. Isso não é bom! Muitas vezes me sinto como criança sozinha, fragilizada.” Quem me dera voltar no tempo”. Jonas, jamais seria uma escolha. Resgatar minha menina interna com a consciência de agora, é tudo que preciso. ” Procurando por mim”!  – Queixa de Ana Rita, quando buscou psicoterapia. (Depois de participar de um Workshop na integração entre corpo e mente. Chegou em meu consultório na busca  de um trabalho emocional na linha de Reich). “Concomitantemente Ana Rita está começando um movimento social, na ampliação da consciência, em defesa das mulheres que sofrem violências domesticas, tanto físicas quanto psicológicas”.

ALIMENTOS LILAZES! ( SAÚDE INTEGRADA).

Hábito tem um imenso poder sobre a qualidade da saúde em geral. Através dele podemos selecionar formas doentias ou saudáveis de levar a vida. Quando desenvolvidos, norteiam atitudes, tanto emocionais quanto comportamentais. Padrão mental se forma exatamente com a repetição constante de situações, de pensamentos e de sentimentos. Interferem direto em nossas vidas. As pessoas ao longo da existência vivem inúmeras experiências e nesse processo crescem e amadurecem. Desenvolvem uma visão específica sobre saúde, família, relações afetivas, finanças, entre muitas outras. Geralmente esse processo se inicia na infância e segue pela vida. “Os padrões mentais nos estimulam a crescer ou nos limitam”. Definem nossas escolhas e decisões, na maioria das vezes. (O modelo mental é desenvolvido de acordo com crenças e  influencia o comportamento). A partir dessa consciência podemos medir a importância desse tema diante da vida. Abrir um espaço e viajar em nosso interior. Investigar modelos internos. Construtivos ou autodestrutivos? Pode-se tentar verificar desde o tipo de alimento que ingerimos para nutrir o corpo até os tipos de sentimentos com que alimentamos a alma. Identificar e alterar padrões nocivos é complicado; eles se tornam automáticos em nossas atitudes, porém é o único jeito para tentar reabilitar o equilíbrio mente-corpo. (Ajuda psicoterapêutica funciona bem). Pensamentos involuntários interferem o tempo todo. Outro caminho excelente é exercitar yoga.  Concomitantemente, referências em cursos ou leituras sobre alimentação saudável podem indicar os caminhos rumo à reparação do que foi cristalizado em nossa mente e não está nos fazendo bem. Tanto física quanto emocionalmente. (Integração entre mente e corpo pode ser transformadora). Impulsionar a mente nessa direção é um trabalho voluntário e demanda intenção e foco. É como fazer uma boa faxina! O resultado final é sensação de leveza. Sentir-se bem naquela casa! Vale a pena experimentar comer colorido. Legumes, frutas, verduras fazem a festa nas células da maioria das pessoas. Assim também como desintoxicar a mente e o coração de pensamentos e sentimentos negativos que realimentam atitudes neuróticas. “Padrão neurótico é  uma mala sem alça”! O efeito colateral dessa assepsia é a circulação da energia saudável e um novo olhar para a vida. Durante um papo desse tipo com alguns alunos de psicologia  muito mobilizados com o tema (lá pelo fim da aula), num momento de descontração, alguém do fundão expressa:- VOU ME DIVORCIAR HOJE. ALIMENTO LILÁS JÁ. RISADA GERAL!

FIM DO MUNDO! (DELÍRIO).

Sensação de bola de fogo baixando sobre a terra. Sol ardente. Queimava. Queimava muito! Elise não aguentava mais! Calor intenso vindo por todos os lados. Caminhava no deserto. Areias brancas e finas. Tão brancas. O reflexo do sol sobre elas turvava a visão. Temia que não desse tempo de chegar ao seu destino, embora não tivesse clareza sobre qual seria esse destino. Sabia que tinha uma missão a cumprir, mas, no entanto, também não tinha clareza sobre ela! De uma coisa tinha certeza: seria muito importante, vital, para sua evolução como ser humano. “Cumprir a missão”. Só teria consciência no fim do caminho! Confusa e culpada, sentia que não organizara prioridades essenciais. “Não podia ter negligenciado assim, meu Deus”! Agora – não tinha saída – correria o risco. Foi então que, pausadamente, observou ao redor. Assustada, percebeu que não havia nem um sinal de vida. “Nem uma formiga, que fosse”! Assustou-se! O sol cruel não perdoava. Cabeça fervendo (dentro e fora), apesar do chapéu. Medo acentuado aumentando. Ninguém para lhe dar a mão. Num impulso de vida, mesmo sem norte, acelera os passos tentando chegar em algum lugar onde se sinta mais segura. Bolhas ameaçadoras estourando nos pés. Dor beirando o insuportável! Garganta seca. Sede desesperada. Língua grudada na boca. Sensação de estar colada. Respiração curta e acelerada. Pensamentos confusos, enlouquecedores. Visões de aranhas imensas voando em sua direção; outras vezes, borboletas transformando-se em monstros carnívoros querendo atacá-la. Seu racional reagiu na tentativa de sobrevivência, recuperando parcialmente a lucidez, como último recurso.  Organizou os pensamentos! Tremendo esforço tentando sair daquela situação suicida. Essa breve recuperação não durou muito. Apenas instantes! Quadro mental caótico voltou. Visão cada vez mais embaçada. Sombras e vultos! Num milésimo de segundo pensou que as visões pudessem ser Anjos Salvadores. “Anjos e aranhas voadoras”! Simultaneamente. Duvidou de sua sanidade. Ambivalência total! Pernas muito bambas, mal conseguia ficar em pé. Sensação de desmaio. E o sol lá! Causticante, impiedoso, persistindo. Ignorava seu sofrimento! Já quase sem visão alguma, fecha os olhos, pisca bem forte, tentando melhorar a cegueira que sente se aproximar. Depois de repetir esse exercício, algumas vezes, como num milagre, consegue vislumbrar bem distante, lá no fim das dunas, vultos humanos se movimentando. Instantaneamente se revigora. Quis acreditar naquele vislumbre. “Sinal de vida se aproximando”! Força absurda emerge das entranhas. Acelera os passos naquela direção. Talvez tenha encontrado a saída! Nem sente mais a dor insuportável nos pés, tamanha a excitação. Começou salivar vida! Apressou-se. Passos acelerados. De repente se viu correndo. Correndo atrás da salvação! No entanto, foi percebendo alguma coisa estranha no ar. Por mais que corresse não sentia que se aproximava dos vultos avistados. Pior ainda, sensação que não tinha saído do mesmo lugar. Pensa em seu desespero: cadê as pessoas? Esfrega os olhos, agoniada.  Impotência esmorece de vez o  seu corpo. Pernas cambaleiam. Cai na areia escaldante como um saco de areia. Semiconsciente. Tem a sensação que uma nuvem enorme e  fervente está para cair em sua cabeça. Conforme essa nuvem se aproxima, ela consegue vislumbrar uma fumaça lilás e negra formando a frase  “FIM DO MUNDO!”. ( ELISE ACORDOU).

NÃO ERA HORA DE PARTIR! (ESPERANÇA).

Todas as manhãs a mesma rotina. Pontualmente, sete horas e trinta minutos, lá estava eu passando pela  praça da Avenida Joaquina. Arborizada, florida, linda!  Alguns ipês amarelos também alegravam o caminho. Nos dias ensolarados havia mais encanto ainda. Presente dourado  oferecido pela  natureza ! Essa alameda ficava bem pertinho da biblioteca onde eu trabalhava como bibliotecário. Assim que me formei, conquistei esse emprego. Foi festa. Grande sonho daquele momento de vida! Sentia tanto prazer no trabalho que nem percebia o tempo passar. Adorava ler sobre plantas e suas diversidades e todos os temas ligados à agricultura. Sempre buscava  novidades sobre esses assuntos. Ali havia grandes obras. Sentia-me afortunado. Um verdadeiro privilegio. Assim que surgia um tempinho, aproveitava e ia correndo procurar lançamentos interessantes. Num desses momentos, folheando um livro  relacionado à diversidade da “Floresta Amazônica”,  considerada a maior biodiversidade do planeta. Muito absorto e surpreso com a citação das milhares de espécies de plantas, mamíferos, anfíbios, pássaros e peixes. Distraído,  folheando as páginas, ouvi uma  meiga voz, dirigindo-se a mim. Desfoquei minha atenção! Levantei a cabeça e avistei uma figura iluminada. Indagou- me sobre referências recentes do tema que eu estava folheando. Esboçando um sorriso pela coincidência, entreguei-lhe o livro. Era uma tarde de quinta feira. Primavera! Sol ameno invadia as janelas da biblioteca.  Foi assim que conheci “Esperança”! Estudante de agronomia. Mais ou menos vinte e cinco anos de idade. Introspectiva. Rosto sério. Cara de intelectual. Num cenho acentuado, as sobrancelhas moldavam um par de olhos extremamente expressivos e sonhadores. Seus olhos, ainda que doces, escondiam um jeito rígido de ser. Não se encaixavam naquele rosto de expressão tão séria. Hoje, passado quatro meses, entendo diferente aquela expressão rígida! Por trás daquela rigidez  e introspecção, se escondia uma menina insegura e sonhadora. Era sua defesa! Talvez tenha tido uma educação severa. Quem sabe! Esperança era linda. Cabelos longos e cacheados, de um castanho brilhante. Tinha o hábito de jogá-lo para trás com as mãos, enquanto eu puxava conversa com ela. Era um charme! Começou a frequentar a biblioteca. com assiduidade. Adorava o momento em que ela chegava. Eu fantasiando cenas incríveis entre nós. Ela nunca baixou a guarda. Inacessível! Acho que esse fato me excitava ainda mais. Quantos sonhos noturnos invadidos por Esperança! Fiquei viciado em aguardar sua chegada todas as quintas feiras, à tarde. Parecia que ela e os ipês entravam juntos. Tanta luminosidade. Tamanha a energia,  colorindo minhas emoções! Menina mulher  emanando perfume agridoce, aromas que mexiam em meus desejos inconfessos. Essa contradição entre seu olhar e atitude tornou-se um mistério envolvente. Apaixonei-me, perdidamente, por aquela menina. Até meio obsessivo. Já não era normal pensar nela do jeito que eu pensava.  Vinte e quatro horas por dia. “Eu era Esperança”. Brigava comigo mesmo com raiva daquela dependência emocional que controlava os meus sentidos, sem receber o menor retorno de Esperança. “Quintas feiras virou  paranoia”! Acordava feliz. Tomava um banho cheiroso. Escolhia uma roupa que encaixasse com o colorido daquele dia. Treinava expressões sedutoras frente ao espelho, para conquistar Esperança.  Queria aquela menina para mim! Assim, o tempo foi passando. Eu sonhando como um adolescente. Até que numa quinta feira quente, início de verão, Esperança não chegou. Gelei! Fiquei angustiado! Ansioso. Esperei-a em todas as  quintas seguintes. Qual nada! Esperança sumiu. Sem deixar  rastros. Sofri a perda de uma grande paixão. Pensei em  morrer. Saudades de seu olhar triste e sonhador. Foi cruel ter  sonho destruído. Dia destes, num repente, enquanto trabalhava, senti seu cheiro passeando por lá. Meu coração disparou. Corri como um doido até o cantinho em que ela  gostava de ler. Decepção inconsolável. Até duvidei de mim. Será que enlouqueci? Seria fruto de minha imaginação? Não havia nem sombra dela. Só que sentia o aroma agridoce emanando daquele canto.  Sei lá. Ultimamente a saudade anda me intimando:- CORRE ATRÁS DA ESPERANÇA SENÃO TE MATO!

QUAL É A SUA, CARA? (CÉREBRO).

Nunca mais vou deixar de consultar o “grande comandante”. Ele sabe das coisas. Todas as vezes que o ignorei foi um desastre. Não foi culpa minha! Não tinha ideia de sua força. Sempre fui desequilibrada mesmo! Parecia um animal, agia só através dos instintos. Simplesmente não conseguia reconhecer sequelas desastrosas de meus atos. Assim fui caminhando pela vida. Inconscientemente. Errei muito! Confusão emocional é o que mais me acometia. (Raiva mesclada com impotência). Sentia-me como numa gangorra subindo e descendo. Dois lados opostos: Potência e Impotência! Na impotência, a sensação era como se eu fosse uma sombra de mim mesma. Um fantoche! Sem forças pra tomar um simples banho ou alguma atitude saudável. Era como se eu estivesse morrendo. A vida não fazia sentido. Remédios psiquiátricos? Até tentei! Depois de algum tempo faziam lá seus efeitos, limitados. A longo prazo sabia que sequelas inevitáveis chegariam. (Falta de libido. Apatia. Dores musculares). Tinha muito medo de prejudicar ainda mais minha saúde tomando esse tipo de medicamento. (Escolhi interromper esse tratamento em pouco tempo). Já, na potência, o sentimento preponderante era a raiva. Invadia os meus sentidos, desnorteando ou bloqueando a sensatez. Horrível sensação! Não tinha lucidez psíquica pra identificar esse sentimento em mim. Sabia que algo estava errado, porém não reconhecia a base emocional que me impelia a uma agressividade desmedida. Nenhum auto controle sobre a situação. Minha saúde física gritava por socorro. Vários sintomas orgânicos foram emergindo. Fiquei até hipertensa. “Não queria tomar remédios para pressão alta, e, ao mesmo tempo, tinha  medo de enfartar sempre que sentia pressão no peito. A luz vermelha acendeu mais intensamente no último domingo de maio do ano passado. Crise brava me acometeu! Cinco horas da tarde. Motivo banal. A cafeteira quebrou bem quando eu estava meio deprimida e fui fazer um café. Comecei a passar mal. Parecia que ela era culpada em me frustrar. Arrebentei-a contra a parede. Perdi o auto controle! Surgiu uma raiva absurda. Raiva do mundo. Raiva de mim! Vontade de quebrar tudo que estivesse em minha frente. No coração, angústia incrível. Sensações assustadoras invadindo todo o meu ser, num crescer. Não me reconhecia. Poderosa força cegou-me. Explodia ou Implodia! Morreria assim? Conflito. Instintivamente, num gesto de sobrevivência, abri a porta, e fui andar na praia. “Talvez o mar com sua magia me acalmasse”. Assim que peguei ritmo no caminhar, a fumaça que embaçava os meus pensamentos começaram a se desfazer, lentamente. Ideias mais claras se aproximaram. Num repente, sensação de vida! Necessidade intensa de me livrar das energias agressivas que se apoderavam de mim. Entender de onde vinha aquela loucura toda. Porque? Qual seu significado? Mais calma e oxigenada, tentei conversar com meu cérebro. Estava difícil estabelecer esse diálogo, até então. Somente o emocional e o instinto andavam me comandando.. Num “insight “, enquanto acelerava os passos e um vento energético acariciava a minha face, pele, cabelos, foi nascendo uma sensação de leveza que envolveu todo o meu ser. (Naquele instante senti que era possível ser feliz). Voltei para casa. Revigorada e determinada. Foi o momento transformador dessa crise! Procurei uma excelente psicóloga. A terapia está ajudando a colorir a minha vida. Não vivo mais em preto e branco! Sabiamente ela está conduzindo a integração entre o que sinto e o que penso. Além de trabalhar os conteúdos emocionais que desencadeiam as crises insanas. A descoberta de minha força interna e a forma de administrar a impotência estão alterando a minha maneira de enxergar o mundo. Fiquei surpresa com o jeito que aprendi de lidar com a raiva. (Usar a razão antes da explosão). Faz a diferença!  É um exercício difícil, impedir que impulsos me dominem. (Questionar o comandante e respirar)! Já entendi que identificando o sentimento presente e a forma como o expressamos, pode ser o início da melhora. Essa consciência fortalece para o próximo passo que é conseguir diagnosticar o motivo da raiva! Entendi que tentar desviar o pensamento para um outro foco, desenvolve o auto controle. Dar um tempo antes de expressar! (Contar até dez lentamente pode ajudar). Evitar reações abruptas, irracionais. Outra forma é nos afastar do ambiente em que estamos, “dar uma volta”. Ponderar! Com a expansão da consciência a visão clareia. Até conseguimos avaliar a parte positiva do quadro estressante. Toda situação tem o aspecto positivo e o negativo. (Fixar no positivo). Vale super a pena. Aprendo também que a raiva bem dosada pode ser construtiva. É um sentimento legítimo. (Um diálogo com respeito e verbalização transparente, pode ser edificante). Além do mais alivia o peito sem destruir sentimentos e energias. Para se atingir esse equilíbrio é necessário fortalecer a mente e integrá-la aos sentimentos, cada vez mais. Tenho vivido sensações incríveis nessas experiências! Fato interessante:- Noutro dia, sonhei estar muito enraivecida. Meu cérebro brigava com uma raiva incontrolável, A raiva era bem escura, quase preta. Disforme e forte. O cérebro lilás tentava iluminá-la e diminuir sua força. Ela resistia muito. O cérebro não desistia! Essa aproximação forçada foi diminuindo a resistência da raiva. Num ímpeto inesperado, já enfraquecida, com medo de morrer, a raiva perguntou ao cérebro:- QUAL É A SUA , CARA? ACORDEI RINDO!